Você já parou para pensar na dimensão e na importância do trabalho das mais diversas organizações da sociedade civil (OSCs), mais conhecidas como ONGs ou organizações não governamentais? Essas entidades beneficentes, coletivos, fundações, associações, enfim, são resultado de pessoas que se unem para sanar ou reduzir problemas sociais ou socioambientais que estão ao nosso redor e que o poder público não dá conta de resolver, por inúmeros motivos.
Assim, elas criam e desenvolvem iniciativas que brotam muitas vezes do coração, da empatia, da vontade de abraçar uma causa, e são, sobretudo, um exercício diário de fé na humanidade e na democracia.
Importância para a economia do país
Talvez você não saiba, mas as ONGs têm uma participação importante na economia no país. Segundo a Fundação Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), existem cerca de 820 mil ONGs em atividade por aqui, atuando nas áreas de educação, saúde, meio ambiente, assistência social, esporte, cultura e outras. Em conjunto, elas geram 6 milhões de postos de trabalho, representando 5,9% das ocupações.
E mais: são responsáveis por 4,27% do PIB brasileiro, que é a soma de todas as riquezas geradas no país. Isso é mais que o dobro da indústria automobilística (1,7%) e quase equivalente à agricultura (4,6%). Os dados são da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe).
Cultura de doação
Mas, para que toda essa engrenagem funcione e se mantenha ativa, um ingrediente é fundamental: a cultura de doação, ou seja, a crença na colaboração entre as pessoas como modo de transformar a realidade social.
“Essa cultura é fruto da construção de um tecido social colaborativo, que vem com o amadurecimento sobre nossa corresponsabilidade como cidadãos. É uma cidadania ativa”, diz Richard Sippli, diretor de operações e relações institucionais do Movimento Bem Maior, ONG que capta recursos junto a grandes doadores (ao menos R$ 500 mil ao ano por pessoa física) para potencializar organizações que multiplicam impacto e impulsionam a justiça social no Brasil.
Toda doação gera transformação
“Engajar os milionários e bilionários em causas sociais é muito importante porque eles detêm o poder e precisam fazer sua parte”, considera Sippli, mencionando uma recente pesquisa feita pela Oxfam, organização de abrangência global contra a pobreza e a desigualdade social, que revelou que a fortuna dos cinco homens mais ricos do mundo mais que dobrou desde 2020, enquanto quase 5 bilhões de pessoas ficaram mais pobres. No Brasil, o indivíduo mais rico possui fortuna equivalente ao que tem a metade da população mais pobre do país.
Mas nem só de contribuições em dinheiro vive a cultura de doação. “Há muitas formas de doar. Podemos doar roupas, alimentos, um pouco do nosso tempo e trabalho. Uma figura pública, por exemplo, pode doar sua imagem para uma campanha ganhar mais visibilidade. Doamos o que podemos, o que temos a oferecer”, afirma a fundadora e presidente do Instituto Beja, Cristiane Sultani, para quem doar é um ato espontâneo de empatia.
Segundo ela, os brasileiros são muito bons em doar em situações de emergência. “Nós nos mobilizamos rapidamente para ajudar famílias vítimas de desastres naturais ou combater a fome no auge da pandemia”, conta. O mais difícil, ela diz, é desenvolver uma cultura de doação pensando em desafios de médio e longo prazo.
“Para isso, precisamos repensar a maneira como comunicamos nosso impacto. Falta uma visão do que o terceiro setor realmente faz pelo Brasil. Já imaginou quantas pessoas deixariam de se alimentar caso as organizações da sociedade civil parassem de trabalhar?”, questiona.
Doar é confiar
Apesar de todo o impacto social que geram, um estudo feito pelo Ipec Inteligência apontou que, em termos de índice de confiança social, a população brasileira confia mais em bancos do que em ONGs. “É um dado que merece atenção, especialmente porque vivemos um contexto global de estreitamento do espaço cívico, crescimento do autoritarismo e polarização política”, avalia a comunicadora Christiane Sampaio, coordenadora executiva da Sociedade Viva, movimento criado em 2023 para melhorar o diálogo entre as ONGs e a população, do qual fazem parte importantes entidades do terceiro setor.
“Precisamos levar mais conhecimento sobre nossa atuação, para que possamos ser mais reconhecidos e valorizados. Dessa forma, aumentaremos a confiança das pessoas nas ONGs e, com isso, poderemos impulsionar as doações de todo tipo e fortalecer essa cultura no Brasil”, completa Christiane.
Estratégias e incentivo
Na mesma trilha, o Movimento por uma Cultura de Doação estabeleceu cinco diretrizes para promover o ecossistema de doação entre 2020 e 2025. Entre elas está a ideia de que precisamos falar mais sobre o assunto para engajar as pessoas, transformar o ato de doar em conversa do dia a dia, da mesa do jantar, além da necessidade de criar um ambiente favorável à doação, sem barreiras tributárias e com acesso mais democrático aos serviços bancários para doações.
“As pessoas desconfiam do que não conhecem. Então, quem sente vontade de ajudar, mas não sabe como escolher uma ou mais ONGs para doar, pode começar se perguntando sobre o que a move ou que causa mais se aproxima de seus valores”, sugere Richard Sippli.
E você, já sabe como ser parte dessa cultura que ajuda a fazer do mundo um lugar melhor para todas as pessoas e a natureza?
Por Giuliana Capello – revista Vida Simples
Jornalista, já atuou em ONGs socioambientais e gosta de sonhar e imaginar que futuros possíveis (e melhores) são construções coletivas.