O Big Brother Brasil 24 estreou há 2 semanas, tempo suficiente para que alguns participantes sejam acometidos por um fenômeno crescente: a cultura do cancelamento. Essa tendência se manifesta principalmente nas redes sociais, como Instagram, X (antigo Twitter) e Facebook.
Inicialmente, surgindo para incentivar questionamentos e debates sobre comportamentos prejudiciais, o cancelamento na maioria das vezes se desvia do propósito original. Ao invés de promover discussões construtivas, torna-se um cenário em que atitudes e pensamentos são condenados sem espaço para diálogo.
“Em meio à busca por entretenimento, as massas tornam-se juízes virtuais, elegendo vilões e desencadeando diversas críticas e ameaças. A pessoa rotulada como ‘vilã’ do reality acaba se tornando alvo das frustrações coletivas”, relata Tatiane Paula, psicóloga clínica.
Entretenimento sobre a ética
A psicologia desempenha um papel essencial nesse espetáculo midiático. Segundo Tatiane Paula, a representação de participantes como mocinhos e vilões revela uma necessidade coletiva de encontrar inimigos, transformando o jogo em uma dinâmica de grupo em que a coesão social é construída às custas da reputação e do bem-estar emocional não apenas do participante do reality, mas também das pessoas próximas a ele.
“Os realities shows, em sua essência, submetem os participantes a uma intensa pressão. A exposição ao público cria uma dinâmica de jogo e espetáculo, muitas vezes priorizando o entretenimento sobre a ética. Em busca da possibilidade de ganhar dinheiro e fama, os participantes podem adotar estratégias controversas, alimentando um ciclo de dramas e conflitos”, explica Tatiane Paula.
Ideal coletivo de mocinhos e vilões
A psicóloga ressalta que a reflexão sobre nosso papel como consumidores e produtores dessa narrativa é fundamental. Ao compreender as dinâmicas psicológicas envolvidas, podemos questionar nossa contribuição para esse espetáculo, promovendo uma cultura mais crítica e consciente diante dos impactos reais sobre a saúde mental e emocional dos envolvidos.
Além disso, há uma associação curiosa com personagens de novelas, mas no contexto da realidade. “A representação do participante como vilão ou mocinho não é um espelho fiel de quem são fora das telinhas. O público é instigado a refletir sobre a complexidade por trás dos comportamentos exibidos, reconhecendo que a construção de personagens está sujeita à manipulação do espetáculo”, esclarece.
Impacto da cultura do cancelamento
Recentemente, o cantor Rodriguinho, participante do camarote do BBB 24, enfrentou ameaças e críticas nas redes sociais por sua participação no programa. Paralelamente, a influenciadora digital Vanessa Lopes, temendo passar por isso, tomou a decisão de apertar o botão e abandonar o programa.
Esses eventos destacam a pressão e os desafios enfrentados pelos participantes diante da intensa exposição e do julgamento virtual, ressaltando a urgência de discutir os impactos reais da cultura do cancelamento nos bastidores do entretenimento televisivo.
Nuances sociais dos realities shows
Segundo Tatiane Paula, George Orwell, décadas atrás, capturou nuances sociais que ressoam nos realities shows modernos. Seus enredos, como em “1984” e “A Revolução dos Bichos”, ecoam nos dramas televisivos atuais, oferecendo um olhar perspicaz sobre vigilância, manipulação de verdades, poder e a distração proporcionada pelo entretenimento.
“Ao mergulharmos nas tramas desses programas, devemos lembrar que cada participante, ao escolher sua estratégia, contribui para uma narrativa cuidadosamente manipulada. A reflexão profunda nos permite evitar julgamentos precipitados, compreendendo que o reality é um espetáculo desenhado para capturar audiências, mas que não reflete integralmente a verdadeira natureza dos envolvidos”, conclui.
Por Lais Fiocchi