8 caminhos para uma educação antirracista

8 caminhos para uma educação antirracista
A educação antirracista deve ser construída desde cedo (Imagem: GagliardiPhotography | Shutterstock)

As questões raciais devem ocupar o centro das discussões na construção de uma sociedade justa e democrática. Infelizmente, são frequentes os casos de racismo e violência contra pessoas negras. A desigualdade social e a pobreza são marcadas por cor e raça. Urge a necessidade de buscar, de maneira imediata, estratégias concretas de combate ao racismo e de promoção responsiva das diferenças.

No ano de 2023, celebramos duas décadas da promulgação da Lei 10.639/03, que tornou obrigatório o ensino da história e cultura afro-brasileiras nas escolas. Este marco representa um avanço significativo para a educação e a construção de uma sociedade mais inclusiva.

No entanto, se verdadeiramente almejamos um Brasil melhor, é crucial intensificar nossos esforços em prol de uma educação antirracista. Devemos reconhecer que essa é uma responsabilidade de todos, não exclusiva das instituições de ensino. As famílias precisam colaborar, refletindo sobre essas questões, avaliando seu papel na promoção das diferenças e apoiando as iniciativas escolares.

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Sendo assim, confira pequenas ações que podem contribuir para efetivar uma educação antirracista:

1. A educação antirracista é uma responsabilidade de todos

Apesar de a Lei 10.693/03 concentrar a responsabilidade nas disciplinas História, Língua Portuguesa e Arte, é importante destacar que toda comunidade escolar precisa assumir as discussões. Cada componente escolar pode, em diversos momentos, trazer as pautas à tona. Não se trata de criar um conhecimento ou conteúdo novo, e sim de utilizar o próprio conteúdo para questionar ausências, para apresentar sujeitos e possibilidades.

O mesmo acontece no núcleo familiar: a família precisa discutir as questões raciais. Afinal, precisamos diariamente trazer estas questões para o nosso cotidiano.

Menina sentada escrevendo em um caderno
Problematize com seus alunos sobre como os negros são representados nos livros didáticos (Imagem: Ground Picture | Shutterstock)

2. Observe o entorno, destaque/questione presenças e ausências

Nas escolas, observe se e como as pessoas negras estão representadas nos cartazes, nos livros didáticos (não só os de Língua Portuguesa, História e Arte). Verifique se elas aparecem nos livros de Matemática como grandes cientistas, como produtoras de conhecimentos. Problematize com seus alunos.

No caso das famílias, ande com crianças e adolescentes pelas ruas; entre em shoppings, bancos, hospitais, observe onde estão as pessoas negras. Problematize as funções e os cargos que elas ocupam, como as diferenças estão postas em nossa sociedade.

3. Preste bastante atenção à linguagem: como as pessoas utilizam as palavras para se referirem ao outro?

A linguagem é muito importante, porque ela nos constrói, hierarquiza ou subalterniza as pessoas. Observe alguns termos simples, por exemplo: como os adjetivos “bonito”, “feio”, “negro”, “imundo”, entre outros, são utilizados?

Perceba como termos diferentes são usados para pessoas de raças diferentes em situações próximas: “adolescente”, “negro infrator”, “jovem negro foi pego roubando”. Estes termos mostram claramente quem é o negro e quem é o branco, assim como nossa condescendência com as pessoas brancas. Ao mesmo tempo, é necessário estarmos atentos às “brincadeiras” ditas “inocentes”: elas machucam, ferem e diminuem as pessoas.

4. Problematize verdades e histórias consolidadas

Ao longo de nossa vida, crescemos ouvindo que vivemos em uma democracia racial, que não existe racismo no Brasil, que pessoas negras e brancas convivem maravilhosamente bem. Questione essas “histórias”, pergunte como é possível vivermos em uma democracia se os piores índices de qualidade de vida e de emprego estão entre as pessoas negras. Busque outras verdades; reflita. Interrogue a falácia do discurso da democracia racial.

Sempre me lembro da relação entre a Dona Benta e a Tia Anastácia de O sítio do picapau amarelo de Monteiro Lobato. Apesar de estarem juntas, a Tia Anastácia jamais vai herdar os bens de Dona Benta. São amigas até certo ponto: enquanto Anastácia servir à família, ela será considerada um membro, mas, no dia em que ela deixar de servir, rapidamente será jogada de lado. Reflita: quantas “Anastácias” conhecemos?

Mulher e homem sentados à mesa conversando e segurando caneca
Pessoas brancas precisam reconhecer os seus privilégios (Imagem: Branislav Nenin | Shutterstock)

5. Reconheça o privilégio de ser branco e busque caminhos para compartilhá-lo

Independentemente da classe social, nascer branco já é um passaporte para transitar em nossa sociedade, para ser reconhecido como sujeito. Repare em seu entorno, perceba seus privilégios, tente reconhecê-los por mais simples que forem, por exemplo: o direito de andar pelos shoppings sem o olhar atento dos seguranças.

Sabemos que é um exercício difícil, porque certas práticas já estão naturalizadas para as pessoas. Mas tente, converse com seus familiares e pessoas brancas do seu entorno. Se possível, se você for branco, tente abrir mão de alguns privilégios.

6. Valorize a representatividade

Seja nas escolas, seja nas famílias, apresente às novas gerações pessoas negras em posição de liderança, responsáveis por tomada de decisões. Sempre destaco que representatividade é diferente de representação. Não se trata de apresentar o quantitativo de pessoas negras — e sim de valorizar aquelas que ocupam uma determinada posição social, que tomam decisões.

A representatividade abre caminhos: procure bonecas negras, livros de autores negros com histórias positivas de negros e negras que possam inspirar. Mostre que nossos ancestrais abriram vários caminhos. Traga-os para as salas de aula, para os seios familiares.

7. Valorize as diferenças culturais

Reconhecer e valorizar as diferentes culturas é a chave para uma educação antirracista. É de grande importância compreender e respeitar a importância do cabelo, da música, da comida, da religião, entre outros, para as pessoas de diferentes origens presentes em nossa cultura.

Não podemos comparar ou hierarquizar culturas e modos de ser no mundo. Devemos valorizar os diversos saberes construídos e produzidos historicamente por povos ancestrais. As famílias e as escolas precisam estar atentas aos seus discursos, ao que dizem e fazem em suas relações cotidianas.

8. Promova o diálogo e nunca se silencie 

O diálogo entre diferentes é a base para conhecer e reconhecer outros mundos. Converse sempre, procure ouvir o outro, o diferente. Reconheça-o como sujeito, como ser humano. Busque o respeito. Coloque-se no lugar do outro, valorize a empatia. Afinal, é conversando que nos entendemos.

Ao mesmo tempo, nunca se silencie diante de casos de injúria racial ou de racismo. Cada vez que você se cala, você apoia o opressor! Coloque-se como uma voz em luta!

Apesar de este texto estar sendo escrito na semana da Consciência Negra, é muito importante destacar que uma educação antirracista se faz no cotidiano, no dia a dia; não se trata de pensar e realizar atividades pontuais.

Devemos lembrar sempre que, se desejamos uma escola de qualidade, uma sociedade justa e democrática, precisamos participar e promover uma educação antirracista. Assim, leia, reflita, questione, problematize, critique, lute, anuncie, compartilhe, busque sempre caminhos para a construção de uma sociedade antirracista, justa e igualitária.

Por Paulo Melgaço da Silva Junior

Doutor em educação, professor na educação básica (SME Duque de Caxias). Organizador, com João José do Nascimento, do livro Caminhos para uma Educação Antirracista (Wak Editora)

Redação EdiCase

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